quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Mamãe



Faz um tempo que eu, esse ser hibrido entre o cansaço e preocupação, não pausa um pouco a loucura cotidiana de ter uma recém-nascida em casa, para poder escrever.

Escrever pra mim mesma, um pouco de visão própria sobre isso tudo que anda acontecendo desde o dia 09 de abril, quando me descobri grávida.

Já estavamos ali com 4 meses e, 3 meses depois, estaria parindo, sozinha, dentro de um hospital após 7 dias de internação.

Eu, esse ser hibrido que teve sua cria internada por 63 dias neste mesmo hospital.
Que ia e vinha todo santo dia pra casa sem a neném, abrindo fissuras incalculáveis dentro da alma.

Juro que tentei segurar a onda entre tanta gente que me alertava: A criança sente tudo, seja grata pela vida."

Mas por quantas vezes acordei de madrugada procurando minha filha seguida da lembrança "aliviada" de que ela estava no hospital.

Quantas vezes vim catártica, dentro do vagão já tarde da noite, depois de horas ensaiando o vir embora, inconformada por estar separada daquela parte tão sensível de mim.


Claro que minha filha precisava de mim, mas quase 20 dias depois dela nascer, quando pude enfim segurá-la no colo, foi que compreendi que o vazio que eu sentia na alma, era pelo fato dela estar aqui do lado de fora, longe do meu corpo.

Por esse mesmo motivo é que, entre dores e desconfortos, mantive a produção de leite por quase 30 dias antes dela mamar pela primeira vez.

Retirar o leite de 3h em 3h era um ritual que me preparava pro meu encontro com ela e que, até hoje, me alivia das angustias da alma.

Amamentar é um descarrego de qualquer ansiedade, do que quero que aconteça no mundo.
Amamentar é o compartilhar de uma energia que sempre borbulhou em mim sem vazão.

E ela suga, suga como quem tem sede do mundo.

Talvez eu ainda me debruce por muitas vezes sobre tantos temas desse processo intenso pelo qual tenho passado.

O que me incomoda agora, véspera dos 3 meses da minha filha,  quase a mesma quantidade de tempo que ela passou dentro da minha barriga de forma oficial é o fato de que nunca estamos totalmente preparados pra nada.

Eu que desejei mais do que tudo esta gravidez, que fiz terapia, acompanhamento medico, físico, psicológico, me sinto um bebê frágil tendo de cuidar e amparar outro bebê.

Antes de me saber grávida eu era uma busca pra entender o que estava acontecendo com meu emocional, com meu espirito e com meu corpo.

Parando pra pensar, processo bem parecido com o que vivo agora.

Existe uma relação, assim nao tão nitida, mas que interfere em todos os meus corpos, materiais ou imateriais com esse novo ser.

SIM, fizemos diversas leituras que nos explicam essa ligação sob inúmeros pontos de vista, mas sinceramente, esse ponto de vista que é somente meu grita aqui dentro como a cólica que minha filha sente a mais de uma semana.

Coisa de entranha e que tambem vi em sua concretude na diarreia que me pegou de jeitoi hoje ao meio dia.
Sensação essa que me põe abaixo, me desconstrói pra me remoldar totalmente nova.

Claro que o puerpério muda totalmente uma mulher.
Claro.

Mas no meu caso, sinto como se tivesse que ter passado por uma grande batalha após uma cirurgia profunda. Sim, a cesárea que salvou minha filha, me cortou literalmente ao meio, também corpo,
alma e espirito como um ferimento de guerra com sua dor física e trauma de batalha.

 E, depois de tudo isso, sob a responsabilidade de engordar uma criança de 1kg180gramas, engordamos todas numa jornada que incluía comer, longe de casa, calorias desconhecidas para o metabolismo do meu corpo.

Me olho no espelho e não me reconheço.
O clima fica pesado.
Minhas amigas me pedem pra focar nas novas curvas de ,mulher que acolhe e provém a vida.
Me engrandeço

Cabelo, ombros, ´seios, braços e bochechas acrescidas de carne, uma marca de cesárea e roupas que não sei mais onde procurar.

Logo hoje, que teríamos uma sessão de fotos relacionadas ao meu trabalho com cura e energia.
Me vi pálida, pós noite mal-dormida, pós-dias e dias de neném grudado no peito, chorando de cólica, e pós-diarréia que me levou o fim das forças.

Logo hoje que não consegui engatar um assunto sequer após o outro. Que me vi muda com minha filha no colo enquanto analisava fotos num tela que parecia expor toda fragilidade vivida nos últimos meses.

E o que eu mais queria agora, longe de ser eu mesma de volta, era apenas que minha filha voltasse a dormir tranquila após as mamadas.
Queria poder voltar a dormir em posição fetal sem que meus peitos ardessem mais do que o normal
pelo bebe estar mamando a mais pra aliviar a dor e se reconfortar.

Minhas amigas que também são mães me afagam dizendo que essa fase passa, assim como passaram os dias de hospital e assim como vai passar esse período tão fofo do bebê.

É preciso aproveitar tudo então, não é mesmo?

A dor, a delícia e esse processo tão devastador que é renascer mãe de um novo ser.

Tá sendo pesado o bastante pra me fazer desesperar em diversos momentos, mas juro: Não trocaria essa experiência única por nenhum grande trabalho em qualquer parte do mundo.

Existem lugares internos de descoberta de uma força só acessadas agora, de profundo amor e conexão com o que existe de mais sagrado no universo só possíveis depois que minha filha nasceu.

É sabido que não precisa doer tanto pra alicerçar uma nova vida, mas creio que quando se trata de ser mãe a dor é inevitável pra atingirmos os estados mais sagrados de beleza.

E talvez esse novo corpo que carrega meu espírito seja mesmo muito diferente do que eu fui durante toda minha vida, mas agora entendo que amparar um novo ser exige mesmo uma nova carcaça.

Vamos nos reconstruindo.

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